Sobre a (in)comunicação

No encontro do dia 15 conversamos sobre o seguinte texto:

Qual é a condição necessário para darmos esta mensagem?
Gostar do ser humano!
(…)
É importante a condição básica de gostar dos outros. Estas não são atividades para egoístas. Estas são atividades para pessoas que interpretam o mundo de outro modo. Não o mundo ao serviço delas.
Estas não são atividades que respondem aos esquemas que hoje existem e que trabalharam sobre nós sem que o advirtamos. Esquemas tais como: eu sou um consumidor, portanto a minha função é a de ser um aparelho digestivo do corpo social. Ou seja, eu estou interpretando o mundo, segundo as coisas que o mundo me dá. É certo que eu também dou, invisto a minha força de trabalho e de acordo à força de trabalho que invisto, recebo em troca bens de consumo.

E isso está bem. Mas dou algo de mim ou faço simplesmente uma troca, talvez necessária ou talvez não tão necessária, para a minha subsistência?
Ponho algo de mim na minha atividade no mundo ou recebo bens em troca de trabalho, um tanto mecanicamente, como uma força de ação e reação?
Que ponho de mim no mundo? Aparentemente não ponho muito. Ponho para receber, e ai ficamos nesse circuito encerrado.
Aparentemente tudo o que acontece no mundo é para mim, se puder consegui-lo. Primeiro problema.
Segundo problema: trato de conseguir e ainda que consiga, sempre fica um sabor de que algo faltou.
De qualquer forma trato de que tudo se refira a mim. Esta é a ideologia consumista, que trabalhou connosco, ainda que nós não o percebamos.
Posso estar no campo, posso estar na cidade; pode ser que me afete o smog ou que não me afete; pode ser que tenha um tipo de dieta ou outro tipo de dieta; mas é a mesma forma mental desta preocupação individual, pessoalíssima, encerrada, onde não aparece no horizonte a possibilidade de me comunicar com o outro.
Diz-se por exemplo: o que está a faltar no mundo é comunicação entre as pessoas. Diz-se…mas isto é verdade?
Hoje mais do que nunca os meios de comunicação estão desenvolvidos. (…)
Hoje mais do que nunca encontro-me com pessoas a cada passo que dou; hoje mais do nunca me comunico por telefone (…) e comunico por milhares de meios e a propaganda e a difusão chega até mim.
O que é isto de que estamos incomunicados? Ou será talvez a sensação de incomunicação a que registo? Porque aparentemente e segundo mostra a realidade estou mais comunicado do que nunca. Será que estou comunicado mas sinto a incomunicação? Isto é outra coisa.
Não será que experimento, ainda que rodeado de gente, que estou como que cercado por um corpo transparente? Não será que me encontro numa situação de não poder conectar num nível emotivo profundo com as outras pessoas? Não será que me falam e falo e nesse falar perde-se o mais importante?
Que é este registo de solidão, de incomunicação, de isolamento? Esta coisa paradoxal que acontece nas cidades, onde a conexão é cada dia mais e mais intensa. Que significa este fenómeno?
A nossa mensagem baseia-se numa necessidade existencial, numa necessidade do ser humano. Este é um ponto de grande importância: se vocês não dão, nunca vão receber. Se acreditas que se trata só de receber objetos, afetos, pessoas, dietas, paisagens, etc…se se acredita isso, irás ter problemas.
O ser humano tem uma quantidade de recetores: olhos, ouvidos, boca, etc. Tem um circuito muito complexo. Mas também tem saídas para o mundo. Se fecharem as válvulas de saída haverá explosão. As pessoas andam preocupadas com as válvulas de entrada; e isso é lógico. A preocupação está em se recebo hoje mais do que ontem e assim seguindo. Mas o ponto está no que acontece com as válvulas de saída. Que interessante.
Assim temo-nos vindo a preocupar com a receção continua e não com a saída. E se houvesse um bloqueio nas saídas, o que aconteceria? Poderiam acontecer muitas coisas. Para além disso depende em que válvulas esteja o bloqueio. Mas se houvesse um bloqueio na saída, que poderia acontecer?
Poderia acontecer, por exemplo, que me intoxicara internamente; poderia acontecer que começara a sentir o mundo e as pessoas e as coisas, como longe de mim. Sentir que não me comunico, sentir-me como que isolado. Claro que sim, parece que é isso o que acontece. Estou isolado e não me comunico e não há verdadeiras mensagens, porque não tenho como comunicar de mim para o outro, porque para isso é necessário que possa dar. E enquanto não dê, a incomunicação será fatal
(…)

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