Mitos raízes universais

No dia 20 de maio lemos e trocamos ideias sobre o seguinte excerto de uma conferência dada por Silo em 18 de abril de 1991 aquando do lançamento do seu livro «Mitos Raízes Universais».

Devo avisar que não entendo os mitos como falsidades absolutas, mas sim, opostamente, como verdades psicológicas que coincidem ou não com a percepção do mundo em que nos cabe viver. E há algo mais, essas crenças não são só esquemas passivos, mas sim tensões e climas emotivos que, plasmando-se em imagens, se convertem em forças orientadoras da actividade individual ou colectiva. Independentemente do carácter ético ou exemplificador que às vezes as acompanha, certas crenças possuem pela sua própria natureza uma grande força referencial.

(…) quando falamos de fortes crenças sobre as quais montamos a nossa interpretação global das coisas, os nossos gostos e rejeições mais gerais, a nossa irracional escala de valores, estamos a tocar a estrutura do mito, que não estamos dispostos a discutir com profundidade porque nos compromete totalmente. Isto vai mais longe: quando um destes mitos cai, sobrevém uma profunda crise em que nos sentimos como folhas arrastadas pelo vento. Estes mitos privados ou colectivos orientam a nossa conduta e da sua acção profunda só nos podemos aperceber de certas imagens que nos guiam numa determinada direcção.

Cada momento histórico conta com crenças básicas fortes, com uma estrutura mítica colectiva, sacralizada ou não, que serve para a coesão dos conjuntos humanos, que lhes dá identidade e participação num âmbito comum. Discutir os mitos básicos de uma dada época significa expôr-se a uma reacção irracional de diferente intensidade consoante a potência da crítica e o arraigo da crença afectada.

(…)

Discutir no momento actual o grande mito do dinheiro implica suscitar uma reacção que impede o diálogo.

Rapidamente, o nosso interlocutor defende-se afirmando por exemplo: “como é que o dinheiro é um mito, se é necessário para viver!”; ou então: “um mito é algo falso, algo que não se vê; ao invés, o dinheiro é uma realidade tangível mediante a qual se movem as coisas”, etc. De nada valerá que expliquemos a diferença entre o tangível do dinheiro e o intangível que se crê que o dinheiro pode proporcionar. Não nos servirá de nada observar a distância entre um signo representativo do valor que se atribui às coisas e a carga psicológica que esse signo tem. Já nos teremos convertido em suspeitos.

(…)

Bem vistas as coisas, nesta ficção pitoresca, não negámos a eficácia instrumental do dinheiro, antes pelo contrário, dotámo-lo de um grande poder psicológico ao compreender que a esse objecto lhe é atribuído mais magia do que realmente tem. Ele dar-nos-á a felicidade e de certa maneira a imortalidade, na medida que impeça que nos preocupemos com o problema da morte.

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